domingo, 22 de junho de 2008

Pode ser que ele esteja maluco

Crônica de João Ubaldo Ribeiro

Estado de São Paulo - 22/08/2008


Sei que, para os lulistas religiosos, a ressalva preliminar que vou fazer não adiantará nada. Pode ser até tida na conta de insulto ou deboche, entre as inúmeras blasfêmias que eles acham que eu cometo, sempre que exponho alguma restrição ao presidente da República. Mas tenho que fazê-la, por ser necessária, além de categoricamente sincera. Ao sugerir, como logo adiante, que ele não está regulando bem do juízo, ajo com todo o respeito. Dizer que alguém está maluco, principalmente alguém tido como sagrado, pode ser visto até como insulto, difamação ou blasfêmia mesmo. Mas não é este o caso aqui. Pelo menos não é minha intenção. É que às vezes me acomete com tal força a percepção de que ele está, como se diz na minha terra, perturbado da idéia que não posso deixar de veiculá-la. É apenas, digamos assim, uma espécie de diagnóstico leigo, a que todo mundo, especialmente pessoas de vida pública, está sujeito.

Além disso, creio que não sou o único a pensar assim. É freqüente que ouça a mesma opinião, veiculada nas áreas mais diversas, por pessoas também diversas. O que mais ocorre é ter-se uma certa dúvida sobre a vinculação dele com a realidade. Muitas vezes - quase sempre até -, parece que, quando ele fala "neste país", está se referindo a outro, que só existe na cabeça dele. Há alguns dias mesmo, se não me engano e, se me engano, peço desculpas, ele insinuou ou disse claramente que o Brasil está, é ou está se tornando um paraíso. Fez também a nunca assaz lembrada observação de que nosso sistema de saúde já atingiu, ou atingirá em breve, a perfeição, até porque está ao alcance de qualquer cidadão, pela primeira vez na História deste país, ter absolutamente o mesmo tratamento médico que o presidente da República.

Tal é a natureza espantosa das declarações dele que sua fama de mentiroso e cínico, corrente entre muitos concidadãos, se revela infundada e maldosa. Ele não seria nem mentiroso nem cínico, pois não é rigorosamente mentiroso quem julga estar dizendo a mais cristalina verdade, nem é cínico quem tem o que outros julgam cara-de-pau, mas só faz agir de acordo com sua boa consciência. Vamos dar-lhe o benefício da dúvida e aceitar piamente que ele acredita estar dizendo a absoluta verdade.

Talvez haja sinais, como dizem ser comum entre malucos, de uma certa insegurança quanto a tal convicção, porque ele parece procurar evitar ocasiões em que ela seria desmentida. Quando houve o tristemente célebre acidente aéreo em Congonhas, a sensação que se teve foi a de que não tínhamos presidente, pois os presidentes e chefes de governo em todo o mundo, diante de catástrofes como aquela, costumam cumprir o seu dever moral e, mesmo correndo o risco de manifestações hostis, procuram pessoalmente as vítimas ou as pessoas ligadas a elas, para mostrar a solidariedade do país. Reis e rainhas fazem isso, presidentes fazem isso, primeiras-damas fazem isso, premiers fazem isso. Ele não. Talvez tenha preferido beliscar-se para ver ser não estava tendo um pesadelo. Mandou um assessor dizer umas palavrinhas de consolo e somente três dias depois se pronunciou a distância sobre o problema. O Nordeste foi flagelado por inundações trágicas, o Sul assolado por seca sem precedentes, o Rio acometido por uma epidemia de dengue, ele também não deu as caras. E recentemente, segundo li nos jornais, confidenciou a alguém que não compareceria a um evento público do qual agora esqueci, por temer receber as mesmas vaias que marcaram sua presença no Maracanã.

Portanto, como disse Polônio, personagem de Shakespeare, a respeito do príncipe Hamlet, há método em sua loucura. Não é daquelas populares, em que o padecente queima dinheiro (somente o nosso, mas aí não vale) e comete outros atos que só um verdadeiro maluco cometeria. Ele construiu (enfatizo que é apenas uma hipótese, não uma afirmação, porque não sou psiquiatra e longe de mim recomendar a ele que procure um) um universo que não pode ser afetado por cutucadas impertinentes da realidade. Notícia ruim não é com ele, que já tornou célebre sua inabalável agnosia ("não sei de nada, não ouvi nada, não tive participação nenhuma") quanto a fatos negativos. Tudo de bom tem a ver com ele, nada de ruim partilha da mesma condição.

Agora ele anuncia que, antes de deixar o mandato, vai registrar em cartório todas as suas realizações, para que se comprove no futuro que ele foi o maior presidente que já tivemos ou podemos esperar ter. Claro que se elegeu, não revolucionariamente, mas dentro dos limites da ordem (?) jurídica vigente, com base numa série estonteante de promessas mentirosas e bravatas de todos os tipos. Não cumpriu as promessas, virou a casaca, alisou o cabelo, beijou a mão de quem antes julgava merecedor de cadeia e hoje é o presidente favorito dos americanos, chegando mesmo, como já contou, a acordar meio aborrecido e dar um esbregue em Bush. Cadê as famosas reformas, de que ouvimos falar desde que nascemos? Cadê o partido que ia mudar nossos hábitos e práticas políticas para sempre? O que se vê é o que vemos e testemunhamos, não o que ele vê. Mas ele acredita o contrário.

Acredita, inclusive, nas pesquisas que antigamente desdenhava, pois os resultados o desagradavam. Agora não, agora bota fé - e certamente tem razão - depois que comprou, de novo com o nosso dinheiro, uma massa extraordinária de votos. Não creio que ele se julgue Deus ainda, mas já deve ter como inevitável a canonização e possivelmente não se surpreenderá, se lhe contarem que, no interior do Nordeste, há imagens de São Lula Presidente e que, para seguir velha tradição, uma delas já foi vista chorando. Milagre, milagre, principalmente porque ninguém vai ver o crocodilo por trás da imagem.

segunda-feira, 26 de maio de 2008

O RETORNO AO ESTADO NOVO E O NOVO CESARISMO

por: Waldo Luís Viana*

Em 1937, Getúlio deu um golpe de Estado e, com a ajuda dos militares, tornou-se ditador. Vargas era ortodoxo e conservador, em matéria econômica, e bastante autoritário em termos políticos. No entanto, ergueu modelo de gestão que forjou nossa infra-estrutura de desenvolvimento. O regime do Estado Novo, instaurado pela Constituição de 1937 em pleno clima de contestação da liberal-democracia na Europa, trouxe à vida política e administrativa brasileira as marcas da centralização e da suspensão dos direitos políticos.

Seu modelo de desenvolvimento baseou-se num Estado forte, em política de industrialização de substituição de importações e, num segundo momento, no capital externo, como desenvolvimento de risco. Tal modelo de Estado desenvolvimentista esgotou as possibilidades de sustentação econômica ao final da década de 70, tendo em vista a recessão ocorrida no país, no início dos anos 1980.

Vargas tinha apoio popular – projetando sobre a nação a imagem de “pai dos pobres” – instaurando de cima para baixo uma legislação trabalhista que acabou se tornando a geratriz do populismo. A “política de populismo” tratava-se de uma prática paternalista, clientelista e cartorial, na qual o Estado exercia tutela sobre a sociedade civil, os sindicatos e demais instituições, regulando a vida de tudo e de todos. O projeto populista de Vargas também incluía a promoção do desenvolvimento interno, com base na empresa nacional e sob a liderança da burguesia urbana.

Conquanto beneficiasse os trabalhadores com leis sociais avançadas, impedia-os de abraçar teorias socialistas que assombrassem de algum modo a elite industrial. Em nenhum momento de seu governo a questão agrária foi tocada. Embora haja favorecido o trabalhador industrial, não melhorou devidamente as condições dos trabalhadores rurais e braçais. Vargas revelou-se contraditório (também era chamado de “mãe dos ricos”) em nome de um projeto que julgava ser o melhor para o país, fechando o Congresso, reprimindo as liberdades públicas, isolando os descontentes, perseguindo os inimigos e impondo-se como estadista popular e divisor de paixões.

Lula elegeu-se sob a égide da “Carta aos brasileiros”, em 2002, convencendo a burguesia industrial e as classes médias medrosas de que não romperia com o regime capitalista, não quebraria contratos nem o regime jurídico regulatório e incipiente que nos governa. Ao prometer que não rasgaria a Constituição, como fez Getúlio, venceu as eleições, prosseguiu com a política ortodoxa, monetarista e fiscal de seu antecessor, aprofundando algumas políticas compensatórias de ordem social e paternalista.

Conseguiu enorme popularidade com o programa “bolsa-família”, principalmente entre as camadas pobres e chegou ao segundo mandato. Não precisou fechar o Congresso, mas, com a enxurrada de medidas provisórias oriundas do Executivo, praticamente paralisou um poder Legislativo desmoralizado, principalmente pelo escândalo do mensalão, ocorrido em 2005.

Lula, assim como Getúlio, fala diretamente ao povo, sem precisar de intermediários. Os partidos, no máximo, colonizam a administração inchada de seu governo, com uma máquina de quase 50 ministérios, divididos pelos aliados que formam uma coesa elite patrimonialista, ocupada em dividir cargos, interesses, influências e privilégios nos investimentos e obras públicas.

O presidente não superou a política populista de Vargas, pelo contrário. Aprofundou a influência das centrais sindicais e dos sindicatos pelegos, mantendo todos os seus privilégios, incluindo a não fiscalização de seus haveres e gastos pelo Tribunal de Contas, tomando, em troca, um apoio político que, em seu modo de ver, lhe garante a continuidade no poder.

Lula não é bobo, é muito esperto, embora tenha nascido de mãe “analfabeta”. Sua popularidade chegou ao auge e não tem para onde crescer, a não ser para a perigosa unanimidade dos regimes totalitários. Nélson Rodrigues diria que “toda a unanimidade é burra”, ao que acrescentaria, com humildade, “e muito perigosa”, porque encobre intenções ditatoriais.

A recente saída de Marina Silva, um grande truque de marketing que surpreendeu e enfureceu o próprio Lula, é um divisor de águas. Um antes e depois de “Cristo”! Antes, Lula ainda escutava o seu partido, aquele antigo do “Lula-lá-perseguindo-a-estrela” – lembram-se? – para agora emporcalhar a sua biografia, atrelado ao PMDB fisiológico de alguns governadores e senadores, interessados apenas em dividir o butim do Erário e das benesses. Esqueceu os valores, mas só pensa em “valores”.

É o apóstolo dos biocombustíveis, de uma trêfega política externa terceiro-mundista, emparedada por todos os lados por outros invejosos países emergentes, faz concessões absolutamente cosméticas às esquerdas, permitindo discutíveis cotas raciais, programas de primeiro-emprego e banco popular absolutamente fracassados, um programa Fome-Zero degenerado em inflação de alimentos, um projeto de obras públicas cujos orçamentos ainda não foram liberados, comícios intermináveis contra uma oposição completamente incompetente e insegura – enfim, trata da própria vida, procurando costurar um impasse político-institucional que conclame a sociedade a lhe pedir um terceiro mandato.

E Lula, docemente constrangido, baseado em pesquisas eleitorais que o alçam a níveis estratosféricos de popularidade – assim como Getúlio – o presidente-operário quer se transformar em novo César. “Vim, vi e venci” – sopra-nos ao ouvido. Não é “sacanagem pura”. Nada pode detê-lo no objetivo de imperador divino de “cuidar do povo brasileiro”.

Como todo proto-ditador, Lula não preparou sucessores. Os pretendentes são todos inferiores, balões de ensaio “in vitro”, incapazes de vingar “in vivo”. Ninguém tem seu carisma e é escutado pelo povo como ele. Os candidatos têm que convencer que são seus filhos, num regime presidencialista que raramente transfere votos. E Lula não apóia ninguém, a não ser quem não lhe ameace o próprio poder. Não tem amigos, tem assessores e vassalos.

Com César e Getúlio foi assim. O primeiro foi assassinado, por uma conspiração de senadores, e o segundo, por uma conspiração da burguesia, da alta classe-média e dos militares, o que o conduziu pela vergonha a dar um tiro no peito.

Com nosso César, a história não acabará como tragédia, mas sim, como farsa. Ele quer legislar sozinho, porque só ele sabe o caminho; não precisa de juízes, consertando os defeitos constitucionais de seu governo, porque magistrado é muito formal e só atrapalha; com os políticos ele não quer negociar fisiologicamente, porque lhe causa nojo e fastio; aos companheiros, ameaça sempre em lhes retirar o tapete, se não fizerem o que ele quer, porque ele é maior que os partidos que o defendem. Sobre os vários escândalos por que o seu curto período de governo passou, Lula tem a dizer que não sabe de nada. Nosso César só precisa de palco e povo. Seu Coliseu é o PAC (o palco) e seus leões famintos, os sindicatos e fundos de pensão. Pão (com trigo caro) e circo (futebol e TV) para o povo. A fórmula está pronta!

A nova aristocracia que o cerca, de sindicalistas, políticos fisiológicos de todos os calibres e a plutocracia de dentro e de fora, agradecidos com os juros altos, não têm qualquer pretensão revolucionária. O Estado, enquanto for maternal, alargando os impostos e os gastos públicos, hipertrofiado por enorme ineficiência, para eles está muito bem como está: “o hômi tá pagano...”

Lula não precisa de um Estado Novo, Brasília é a Nova Roma, uma prostituta, como disse certo tribuno e senador romano. Ela aceita tudo, desde que o poder continue condividido entre as elites predatórias e patrimoniais. O país espanta o mundo com as suas reservas profundas de petróleo, com o biocombustível e a destruição da Amazônia. O novo César quer reformar as Forças Armadas para que não “encham o saco”, colocando os generais, almirantes e brigadeiros em seus devidos lugares. Hoje, os militares são legalistas. Vão para a casa dormir, enquanto esperam as fórmulas mágicas e estrangeiras de Mangabeira Unger e do nosso Comandante Zero, que já rodou muita bolsinha – como disse em recente conferência no exterior.

Marina Silva caiu. A floresta amazônica continua desmatada e Roraima retalhada (pronuncia-se, segundo a mídia politicamente correta “Róraima, como Ângela Ró-Ró”). Os militares na caserna, caladinhos com o aumento salarial concedido e Lula coroado e feliz, colhendo uma floresta virtual de votos...

Regressamos ao Estado Novo, com um novo César e uma floresta virtual de votos! A Pátria está salva...

_________

*Waldo Luís Viana é escritor e economista.

Rio de Janeiro, 17 de maio de 2008.

sexta-feira, 4 de abril de 2008

Vergulho ou orgonha?

Existem leitores que são indispensáveis. Enriquecem nossos textos, abrem horizontes, sugerem caminhos e ampliam as possibilidades. Escrevem para reclamar, para perguntar, para contestar, mas são sempre positivos. Querem construir.Como o Claudio, que ao ler um artigo em que eu falava do orgulho e da vergonha de ser brasileiro, soltou esta pérola: “... se tenho orgulho ou vergonha do meu país? Acho que tenho vergulho... Ou orgonha... Vale ter vergonha e orgulho ao mesmo tempo?”.Ótima pergunta Claudio! Ela resume a contradição do “ser brasileiro”. Hora somos abençoados, hora somos amaldiçoados. Na verdade, talvez sempre tenha sido assim, a história balançando como um pêndulo, indo cada vez para um lado. Se nos anos cinqüenta éramos o orgulhoso país do futuro, cheio de conquistas, de heróis, de música e de esperança, da metade dos anos sessenta à metade dos oitenta ficamos mais sérios, mais contidos, mais medrosos enquanto observávamos o “milagre econômico” e os generais carrancudos. Depois, na década de noventa, durante os anos da abertura, ficamos desorientados, desbundados, perplexos e ansiosos diante da abertura dos portos, da globalização e da democracia. E entramos no novo milênio para descobrir que faltava-nos preparo, estrutura, cultura, coragem e conhecimento para que o Brasil finalmente acordasse de seu berço esplêndido. E broxamos ao descobrir (na verdade, acho que para a maioria a ficha ainda não caiu) que é impossível construir um país sem um plano. E sem gente comprometida a realizar o plano. Pois deu no que deu. Não sei se tenho orgulho ou vergonha no país onde todo mundo tem opinião sobre tudo, baseado naquilo que ouviu dizer. Onde o principal meio de informação é a televisão apressada, superficial e refém dos objetivos comerciais. O país onde política é balcão de trocas. Onde a inveja é moeda corrente, onde uns torcem para que os outros não dêem certo. O país onde o conselho mais comum é: “Cuidado! Agora não é hora! Espera um pouco. Deixa pra depois.”.
Minha esperança está sabe onde? Em nossos filhos. Apesar do massacre cultural sem precedentes vejo neles uma centelha de indignação. Uma pequena chama de revolta produzindo uma tímida luz de esperança. Essa chama pequenina quase desaparece, sufocada por gente que acha normal o Presidente da República elogiar em público um político sabidamente corrupto. Ou o gari que devolveu ao dono o dinheiro perdido ser tratado como herói ou trouxa, nunca como uma pessoa normal. Gente que acha certo “inaugurar” obras pela metade em ano de eleição. Que a televisão explore a tragédia exibindo incessantemente videoclipes melosos da inocente menininha assassinada sabe-se lá por quem. Gente que acha normal um senhor de cabelos brancos, músico conhecido, dizendo na TV que “sem socialismo não dá pra falar de amor”.
É, meus amigos, não está fácil...
Temos que alimentar aquelas pequeninas chamas escrevendo, conversando, palestrando, explicando, provocando... Jamais nos alinhando aos que estão conformados ou acham “normal” o que deveria nos indignar.Para que depois que nos retirarmos da luta nossos filhos continuem até eliminar deste país a cultura do vergulho e da orgonha. Para que um dia um líder verdadeiro diga na televisão, de forma legítima e honesta:
“Nunca antes neste país as pessoas tiveram tanto orgulho. E vergonha na cara”. Luciano Pires

terça-feira, 8 de janeiro de 2008

FRASES SÁBIAS


Entregue um governo nas mãos de um trabalhador socialista e a primeira coisa que ele faz é aumentar impostos;

A segunda é empregar parentes e companheiros;

A terceira é aumentar os gastos sociais inclusive os gastos dele (afinal ele é socialista);

Depois ele vai pensar em como governar.